Você já ouviu falar da “Grande Naturalização”? Como ela afeta a vida dos que buscam o reconhecimento? Neste artigo vamos falar um pouco sobre esse processo que ocorreu em dezembro de 1889, e ainda influencia no processo de reconhecimento nos dias de hoje.
Trata-se de uma naturalização tácita prevista por um decreto onde o estrangeiro que não quisesse ser brasileiro deveria, no período de seis meses seguintes, manifestar tal vontade em ato público lavrado em próprio livro. Ou seja, de acordo com o decreto, aqueles que não fizessem isso deixariam a sua nacionalidade para serem brasileiros, e, portanto, não poderiam transmitir cidadania às gerações futuras.
Como a Grande Naturalização voltou à tona?
No dia 3 de dezembro de 2019, a Dimensione teve uma audiência em que os órgãos Ministero dell'Interno e Avvocatura Generale dello Stato compareceram. Com o argumento da Grande Naturalização, pediam o indeferimento da concessão da cidadania. Com isso, nossos advogados deveriam elaborar uma defesa, que é chamada "memória difensiva”, até o dia 23 de dezembro.
Em nossa defesa, apresentamos um fato que ocorreu ainda no século XIX — no dia 21 de dezembro de 1889, para sermos mais exatos. Trata-se da primeira contestação oficial à Grande Naturalização. Na altura, o Primeiro Ministro e o Ministro das Relações Exteriores da época, Francesco Crispi, enviou uma nota (publicada em I Documentos diplomáticos italianos, Segunda Série: 1870-1896, Vol. XXIII, n. 142, p. 90) às embaixadas italianas em Berlim, Londres, Madri, Paris e Viena, que afirmava os estrangeiros residentes no Brasil na época eram majoritariamente trabalhadores rurais, que não tinham acesso à informação e/ou o decreto, e, portanto, o direito não poderia ser revogado. Não se tratava de uma concessão da cidadania, mas sim da imposição.
Na defesa apresentada, também citamos que a Itália, assim como os Estados Unidos e outros Estados, não pretendiam abdicar de qualquer forma à sua soberania e, portanto, declarou abertamente que a Grande Naturalização era “nula e sem efeito”.
Aqui, cabe evidenciar que a Grande Naturalização ocorreu em um cenário que o Brasil, uma república recém-declarada, visava povoar seu território. Porém, com o governo provisório de Deodoro da Fonseca, o país ainda não havia sido reconhecido internacionalmente como nação soberana pelos países citados acima. Esse fato torna a Grande Naturalização ainda mais ilegítima.
O que os demais juízes da época diziam sobre a Grande Naturalização?
Após essa primeira contestação à Grande Naturalização, muitas outras aconteceram. Entre os anos de 1890 e 1907, numerosas sentenças da suprema corte italiana afirmavam, sem meio termo, que a Grande Naturalização não retirava a cidadania italiana dos cidadãos que emigraram da Itália para o Brasil.
Por fim, em 1907, a Corte di Cassazione di Napoli publicou um decreto que tratava especificamente da questão da naturalização, frisando que a cidadania italiana é transmitida pelo sangue. Assim, os descendentes de um cidadão italiano continuava a ser italiano ainda que tenha nascido em outra localidade.
Além disso, o texto afirmou que a imposição da nacionalidade brasileira aos imigrantes italianos não era válida, visto que não foi uma solicitação/desejo dos mesmos. Essa foi a última abordagem do assunto e, na época, foi unânime a decisão de que os italianos não perderiam a cidadania na Grande Naturalização.
Como sabemos, a advocacia estadual interpôs recurso contra a sentença positiva da primeira instância, essencialmente repetindo os mesmos motivos da primeira instância.
O que esperamos com o exposto?
A nossa defesa assenta substancialmente no facto fundamental de ter sido apresentada a CNN que é um acto que atesta a inexistência de naturalização e que nem sequer foi contestado pelo advogado que se limitou a dizer que não se sabe se o italiano esteve ou não no Brasil na época da grande naturalização mas que certamente o filho não obteve a cidadania pois nasceu antes de 1912.
Portanto, nenhuma prova é fornecida pelo advogado quanto à naturalização do sujeito de acordo com o princípio do ônus da prova de que aqueles que pretendem contestar o direito devem apresentar a prova em contrário.
Além disso, ao não apresentar a prova da naturalização do pai, o filho nem sequer perdeu a nacionalidade italiana sem qualquer manifestação de vontade para o fazer.
De fato, a grande naturalização havia introduzido um mecanismo de presunção tácita de consentimento que foi criticado em nível internacional e nunca foi aceito pelos Estados europeus e nem mesmo pela Itália, que de fato se esforçou para modificar em breve a norma sobre a cidadania.
A este respeito, citaremos o tribunal civil do Sena, bem como a sentença da Corte de Cassação de Nápoles de 1907 e App. Casale de 1902.
Haverá audiência em tribunal de recurso e poderá ser que o tribunal, não havendo atividade preliminar, envie o processo para decisão.
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